quinta-feira, 9 de abril de 2015
Quando Elif
Shafak, nascida em Estrasburgo, França, em 1971, escreveu “A Bastarda de
Istambul”, certamente estava longe de imaginar que o seu romance iria trazer-lhe
tantas atribulações à sua vida, na medida em que, em 2006, no âmbito do artigo
301º do Código Penal Turco, foi levada a tribunal por «denegrir a identidade
turca». As acusações que lhe foram imputadas deviam-se às palavras por si
utilizadas na narrativa, por algumas das personagens arménias que fazem parte
do romance. Felizmente, as acusações contra si formuladas, acabaram por ser
retiradas, pois, caso contrário, corria o risco de vir a ser condenada numa
pena de até três anos de prisão.
Mas o que faz
ser tão peculiar o romance “A Bastarda de Istambul”? A razão do sucesso está em
que Elif Shafak, tanto neste como noutros romances, mistura as tradições
narrativas do Ocidente e do Oriente, dando voz às mulheres, às minorias e às
subculturas numa forma de escrita que nos faz lembrar o estilo de Milan
Kundera, (no seu romance dá o nome de “Café Kundera”, a um dos locais de culto,
como ponto de encontro dos intelectuais de Istambul), desafiando clichés e
transcendendo fronteiras. As suas obras inspiram-se em diferentes culturas e comunidades
étnicas que transcendem as fronteiras dos países originais e refletem um forte
interesse pela história, pela filosofia, pelas minorias culturais, pelo
misticismo e pela igualdade de direitos das mulheres.
A presente narrativa
gira em torno das consequências das atitudes do Império Otomano que, no início
do século XX, quando, no primeiro ano da Primeira Guerra Mundial, o governo
ditatorial do sultão decidiu perseguir a comunidade arménia residente em
Istambul, como sendo esta o bode expiatório dos seus reveses bélicos,
considerando-os espiões e traidores da causa turca.
Em pleno século
XXI, duas jovens de dezanove anos, uma, Armanoush Tchakhmakhchian, americana de
origem arménia, filha de refugiados arménios a viver em São Francisco, a outra,
Asya Kazanci, laica, filha da nova geração de jovens turcos republicanos,
encontram-se um dia na casa de Asya, em Istambul, para se travarem de razões relativamente
aos seus antepassados. Armanoush é enteada do tio de Asya, Mustafá, geólogo a
viver e a trabalhar no Arizona e casado com Rose, a mãe de Armanoush,
tornando-se grandes amigas.
A ironia do
destino juntou estas duas jovens, já que, a jovem turca, terá escapado de nunca
ter nascido por um aborto que a mãe, Zeliha Kazanci, não teve a coragem de concretizar
(é aqui que começa a narrativa do romance) e Armanoush só se liga à futura
amiga e prima por afinidade, porque o seu pai, arménio de origem, se encontra
desde muito novo divorciado da sua mãe Rose, e esta, como atitude de verdadeira
vingança para com o ex-marido, casa-se com o turco Mustafá que conheceu no
supermercado.
Asya Kazanci
vive com sua família alargada em Istambul. Devido a uma misteriosa maldição que
caiu sobre a família, todos os homens Kazanci morrem aos quarenta e poucos
anos, sendo essa uma das razões para que Mustafá, o único varão da família,
emigre para os Estado Unidos, com a intensão de iludir a morte pela referida
maldição e, por isso, o Konak Kazanci é apenas uma casa de mulheres.
Das mulheres com
que Asya vive, destaca-se a sua bela e rebelde mãe, Zeliha, que dirige um
estúdio de tatuagens, usa minissaias extravagantes e um piercing no nariz; a tia Banu, que recentemente descobriu que é
vidente e convive com dois Djinn que lhe dão a clarividência; a tia Feride, uma
ex-vendedora fantástica, que sofre de «esquizofrenia hebefrénica» e que
recentemente tinha mudado a sua maleita para a paranoia, pois quanto mais se
esforçassem para a trazer de regresso à realidade, mais paranoica e desconfiada
ela se tornava; a tia Cevriye que teve um casamento feliz mas depois de ter
enviuvado tornou-se apenas professora dedicada ao ensino da história da Turquia
e é obcecada pela limpeza, Gülsüm, a matriarca da família e avó de Asya e finalmente,
Petite-Ma, a bisavó de Asya.
Quando Armanoush
vem a Istambul para passar uns dias das suas férias da Páscoa com a Asya, a sobrinha do seu padrasto Mustafá, os
segredos de família há muito tempo escondidos, relacionados com o passado
tumultuoso da Turquia, começam então a ser revelados.
Elif Shafak, romancista
com uma nomeação para o “Orange Prize for Fiction” no seu currículo, é uma das autoras
mais lidas na Turquia, sendo considerada pela crítica como uma das vozes mais
originais da literatura contemporânea tanto em língua turca como inglesa. Shafak
é formada em ciência política e leciona em várias universidades dos Estados
Unidos da América, do Reino Unido e da Turquia. Escreve para diversas
publicações da imprensa diária e semanal, donde se destacam os “The Guardian”, “The
New York Times”, “The Independent” bem como para a plataforma digital “World
Post/Huffington Post”.
Casada e mãe de
dois filhos, divide o tempo entre Londres e Istambul. Os seus livros encontram-se
traduzidos em mais de 40 línguas sendo considerada uma das vozes mais originais
da literatura contemporânea.
O livro "A Bastarda
de Istambul" foi publicado em Portugal pela Jacarandá, com a chancela da
Editorial Presença. Sendo esta a minha última leitura no mês de abril, com este
romance consegui compreender melhor o que atualmente se passa na Turquia, um
país divido entre o oriente o e o ocidente com um pedido de adesão à União
Europeia mas sempre dificultado pela poderosa Alemanha. Para quem gosta do
género que não perca a oportunidade de o ler.
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1 comentário:
Um blogue muito interessante gostei de visitar.
Um abraço e continuação de uma boa semana.
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